O Brasil assiste a Classe C ter acesso a bens de consumo (p. ex., automóveis) e lazer (p. ex. cruzeiros marítimos). E o fenômeno alcança também o ensino superior, o que é excelente.
Segundo Stanisci, Oliveira e Saldaña, “dos 5,9 milhões de estudantes de graduação no país, 31,4% têm renda familiar entre 1 e 5 salários mínimos. O número quase dobrou desde 2002, quando o porcentual era de 16,2%. Isso tem ocorrido graças a iniciativas oficiais, como políticas de cotas e o Programa Universidade para Todos (ProUni), mas também por causa de universidades que apostam nesse público, cobrando mensalidades baixas – que podem chegar a R$ 180” (Estado, A, Classe C com diploma, 24.11.2009).
Nos cursos de Direito não é diferente. Em passado recente eram poucos, localizados nas capitais e nas cidades médias. E os seus estudantes pertenciam, regra geral, às classes A e B.
Recentemente espalharam-se por todo o território nacional, em mais de 1.000 faculdades de Direito isoladas ou em universidades. O foco desta coluna é o acesso da classe C aos cursos de graduação em Direito.Em tempos de mão de obra excessiva e salários reduzidos, estudar Direito passou a ser uma boa saída para o sucesso profissional. Afinal, as perspectivas são sempre mais animadoras do que as de outros profissionais. O bacharel em Direito poderá advogar, fazer um concurso de nível intermediário ou superior (e são muitos), escolher a área de atuação que mais lhe agrada (p. ex., defender ONGs), trabalhar em cartórios extrajudiciais (p. ex., tabelionatos) e até exercer uma advocacia administrativa especializada (p. ex., infrações de trânsito).
Poucas profissões oferecem tantas oportunidades. Um profissional de Educação Física só poderá ser professor ou atuar em um clube ou academia de ginástica. Um biólogo terá poucas vagas à disposição em um concurso público. Um médico tem que se sujeitar a vários empregos para poder receber um bom salário. Um engenheiro depende diretamente da situação econômica do país, tendo boas chances em épocas de aquecimento econômico, mas lutando com dificuldades em períodos de crises.
Mas quais as chances do estudante de Direito Classe C?
O estudante Classe C poderá, excepcionalmente, estar em uma universidade pública ou mesmo em uma particular de tradição. Mas, normalmente, ele será encontrado nas universidades de bairros, onde o acesso é mais fácil e as mensalidades menores. Boa parte deles é constituída de pessoas maduras e que vêem no diploma uma possibilidade de ascensão social.
O Classe C entra em desvantagem na competição. É inegável. A começar pela dificuldade de pagar as mensalidades. Além disto, tem que trabalhar e isto dificulta nos estágios, mora longe e perde tempo na condução, geralmente não frequentou as melhores escolas, não tem as relações sociais dos colegas das classes A e B, falta-lhe dinheiro para comprar livros ou participar de cursos ou congressos.Mas isto não deve servir-lhe de desânimo. Ao contrário, deve ser convertido em um bom motivo para ir à luta. E para isto, desde o dia da matrícula, deve evitar a postura do “coitadinho de mim”. Primeiro, porque não ajuda nada. Segundo, porque não é uma verdade absoluta. Vejamos.
O Classe C tem uma vantagem a seu favor, a gana, a vontade de vencer. Criado com dificuldades, valoriza o fato de ter chegado à faculdade. É prestigiado na família. Seus colegas mais abastados, nem sempre são fortes. Afinal, cresceram tendo acesso a tudo, internet, passeios à Disney, roupas caras. Por isso não costumam valorizar as coisas. Supõem ingenuamente que a vida lhes será fácil, que o pai lhes conseguirá um emprego. Desacostumados com limites ou dificuldades, no primeiro conflito abandonam a luta. Declaram-se deprimidos.
Os pais do Classe C não puderam estudar e, por isso, não tem como transmitir cultura. Esta é uma desvantagem, sem dúvida. Mas pode ser suprida com muita leitura. Bons livros de literatura, editoriais de bons jornais e revistas são imprescindíveis. E para quem não pode gastar, as bibliotecas oferecem tudo gratuitamente. Pequenos cursos (p. ex., de redação) ajudam bastante.Na educação formal (não escolar), o Classe C não está em desvantagem. Ela pode até ter sido melhor do que nas classes A e B. E se não foi, cabe ao Classe C ficar atento, observar muito e corrigir suas falhas. Falta de educação pode liquidar uma carreira. Por exemplo, a informalidade exagerada com o dono do escritório de advocacia (que não deve ser tratado de você), falar alto, dar gargalhadas em locais mais tradicionais ou ir para o estágio com camisa do time de futebol.
Na busca dos estágios (quando possível), o Classe C terá, por falta de relacionamentos (networking), dificuldades de acesso aos grandes escritórios. Mas boa parte deles, atualmente, reserva um percentual de vagas a estudantes necessitados, dentro de uma política de responsabilidade social. Já junto aos órgãos públicos estará em pé de igualdade, pois a seleção costuma ser feita através de testes.
Nos concursos públicos, o Classe C lança todas as suas fichas. Ser oficial de Justiça, conquistar uma vaga na Polícia ou trabalhar em um Tribunal é um sonho que merece o sacrifício de muitas baladas e viagens. Mas para os Classes A e B o apelo é menor. Por terem acesso a tudo e por não imaginarem que seus pais morrerão um dia e o dinheiro pode acabar, muitas vezes não se dedicam com todas as forças. O Classe C não se importa em mudar de cidade ou de estado. Os Classe A e B são exigentes e assim vêem o tempo passar sem colocar-se profissionalmente.
Resumindo, ser Classe C não é obstáculo intransponível para a vitória. O segredo é fazer das dificuldades a alavanca para a busca do sucesso. E o momento é favorável.
Boa sorte.
Fonte:www.conjur.com.br
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